- Tio, me dá um livro?
Não pude evitar a surpresa. Em uma Copacabana de filhos do crack, mendigos mancos e outras feridas abertas, aquilo soou como poesia.
Foi um tempo, até que me recuperasse daquele choque de lirismo.
- Heim, tio?
“Você sabe ler?”, e ela que sim com a cabeça. “Quê está escrito aqui?”, e ela com os olhinhos exprimidos.
- Essa letra não sei ler não.
O livro era Assim Falava Zaratustra. Sacanagem minha pedir a uma criança que lesse “Zaratustra”. Deixei o Maquiavel que havia em mim de lado e, mais príncipe que niilista, coloquei uma capa bem colorida em suas mãos e passei a mão em sua cabeça, como que a dizer “Have a Nietzsche day”. Aquela situação, aquele realismo fantástico, pedia algo de surreal.
- Alice no País das Maravilhas! Oba!
Saiu correndo e sentou no banco da praça. Dei a ela um livro. Ela me deu um conto e me fez cair na toca do coelho. Bem poderia ter deduzido, mas caminhei até o banco e perguntei seu nome. Com um sorriso indisfarçado, ela me disse, e a resposta não poderia ser outra:
- Vitória.